rótulo embalagem

Senhor Lobo, por que letras tão miúdas?

Era uma vez Chapeuzinho Vermelho, já com 50 e poucos anos, cansada da floresta, fazendo compras num mercado qualquer. Quer um creme antirrugas mas tem dúvidas sobre como usar, e busca informação na embalagem. É só pela manhã? Só à noite? Tem contraindicação? Ela enxerga o caminho da floresta direitinho, cozinha, passa, trabalha no seu lap top, vê televisão, rede social… Mas as letras e algarismos do creme facial não consegue distinguir. É 3 ou 8? I ou 1 ou l? Ela muda de seção e vai comprar suco. Ou néctar? Ou polpa? Qual a diferença? Também não sabe, não dá para ler. Tenta o tira-manchas de roupas em pó, naquela embalagem de plástico que fica torta e com cores chamativas. É para todos os tipos de tecido? Que será esse desenhinho aqui? Na dúvida, não compra. Aos poucos, começa a sentir inveja dos olhos grandes do lobo. “Lobo tem miopia e astigmatismo?”, se pergunta, rindo de nervoso.


Para muitas pessoas, a tarefa aparentemente simples de ler os rótulos das embalagens pode se transformar em um desafio hercúleo devido ao tamanho minúsculo das letras. Essa dificuldade pode ser agravada por questões de visão relacionadas à idade, como a presbiopia(*), que afeta a capacidade de focalizar objetos próximos. Para muitos consumidores, isso pode resultar em frustração e até mesmo em escolhas inadequadas de produtos, simplesmente porque não conseguem decifrar as informações contidas nos rótulos.


Existem várias razões pelas quais as empresas podem não desenvolver embalagens mais legíveis para o público sênior, apesar da necessidade evidente desse grupo demográfico (sem falar nos consumidores que têm problemas de visão de nascença ou devido a algum acidente de percurso…). Procurando em sites sobre embalagens e outras fontes encontrei várias e listo algumas abaixo:


Custos de Produção: Desenvolver embalagens com letras maiores e mais legíveis inclui a necessidade de redesenhar o layout das embalagens, aumentar o tamanho das etiquetas e possivelmente investir em novos equipamentos ou tecnologias de impressão. Para algumas empresas, especialmente as menores ou com margens de lucro apertadas, esses custos extras podem ser proibitivos.


Padrões de Design e Marketing: Muitas empresas investem em design de embalagens que sejam esteticamente atraentes e que se alinhem com sua marca. Alterar esses padrões de design pode ser visto como um risco para a identidade da marca e a atratividade visual do produto.


Público-Alvo Mais Amplo: Embora o público sênior seja um segmento importante do mercado consumidor (a famosa “economia prateada”), as empresas também devem considerar outros grupos demográficos ao desenvolver suas embalagens. Isso pode incluir consumidores mais jovens que preferem embalagens modernas e compactas. Portanto, as empresas podem hesitar em adaptar suas embalagens exclusivamente para atender às necessidades destes consumidores, especialmente se isso significar afastar outros grupos. Mas, se o target é público +50… esse risco TEM que ser levado em consideração, como respeito aos consumidores.


Falta de Conscientização: Em alguns casos, as empresas podem simplesmente não estar cientes do problema ou da extensão da dificuldade que os consumidores mais sêniores enfrentam ao ler embalagens. Sem uma compreensão clara das necessidades de seus consumidores, as empresas podem não priorizar iniciativas para tornar suas embalagens mais legíveis.


Uma solução moderna para esse problema pode ser a inclusão de um QR code nas embalagens. Com um simples escaneamento usando um smartphone, as informações detalhadas sobre o produto seriam acessadas instantaneamente em um formato digital legível, proporcionando conveniência e acessibilidade aos consumidores de todas as idades.


Além disso, os fabricantes podem disponibilizar as informações dos produtos em seus sites, onde os consumidores podem acessar detalhes sobre ingredientes, instruções de uso e outras informações relevantes de forma clara e legível (No ano passado comprei um creme facial para mulheres na menopausa. Praticamente impossível de se ler os ingredientes nas 2 embalagens do produto – cartucho e pote – por isso pesquisei no site do fabricante antes da compra. Se dependesse da compra em loja física, teria desistido. Percebem o erro?). Em tempo: isso não apenas ajuda este grupo específico, mas também pessoas com deficiências visuais e outros desafios de leitura.


Utilizar fontes de tamanho adequado e com boa legibilidade é essencial. Optar por fontes simples e sem serifa pode facilitar a leitura, enquanto evitar o uso de letras muito finas ou estilizadas que possam dificultar a distinção entre os caracteres. Há de se pensar, também, em garantir um bom contraste entre o texto e o fundo da embalagem para facilitar a leitura. Letras escuras sobre fundos claros (ou vice-versa) proporcionam melhor legibilidade, especialmente para pessoas com presbiopia.


Outra ferramenta útil que pode auxiliar na leitura de rótulos (frequentemente usada por esta que vos escreve) é a lupa embutida nos smartphones, como a presente nos dispositivos iPhone. Com essa funcionalidade, os usuários podem ampliar facilmente o texto em embalagens para facilitar a leitura, tornando as compras uma experiência mais acessível e agradável para pessoas de todas as idades. Mas QUANTAS pessoas sabem que o smartphone tem lupa? E QUANTAS usam?


A Anvisa, em dezembro passado, anunciou que vai submeter proposta de ato normativo sobre regulamentação das bulas digitais para uma consulta pública. Com objetivo de padronizar a Lei da Bula Digital, a medida prevê a sugestão de medicamentos que utilizem apenas a versão digital da bula. Como as empresas comunicarão o acesso à bula digital nas embalagens é outro ponto a se pensar!


Além das sugestões acima, é crucial fornecer instruções claras de uso em embalagens de produtos, especialmente para produtos que exigem leitura de instruções detalhadas, como medicamentos ou produtos de limpeza. Em última análise, é crucial que os fabricantes reconheçam as necessidades diversas de seus consumidores e adotem medidas para tornar as informações dos produtos mais acessíveis a todos. Ao implementar essas medidas, as empresas podem garantir que os consumidores com dificuldade de leitura tenham acesso fácil e claro às informações dos rótulos, proporcionando uma experiência de compra mais inclusiva e satisfatória.
E você? Qual embalagem não legível te incomoda mais? Já teve que ajudar alguém ler um rótulo antes de comprar um produto (eu sim!)?

(*) Presbiopia= condição ocular associada ao envelhecimento do olho humano caracterizada por diminuição progressiva da capacidade de focar nitidamente objetos a curta distância

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